Tribunal pretende investigar se Comissão de Anistia está concedendo pensões exageradas
Vasconcelo Quadros
BRASÍLIA - De olho nas indenizações milionárias, o Tribunal de Contas da União (TCU) está questionando os critérios adotados pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça na concessão de valores mensais e retroativos como reparação econômica aos perseguidos durante o regime militar. Os dois casos mais recentes em análise no TCU envolvem os jornalistas Sérgio Jaguribe, o Jaguar, e Ziraldo Alves Pinto, que dirigiam o extinto Pasquim e, pela alegada perseguição durante a ditadura, foram beneficiados, cada um deles, em abril deste ano, com uma bolada retroativa de R$ 1,2 milhão, além de R$ 4.365,88 mensais pelo resto de suas vidas.
O governo gastou com indenizações concedidas nos últimos sete anos, em cerca de 10 mil casos julgados, R$ 2,9 bilhões e paga, como reparação econômica mensal permanente, mais de R$ 90 milhões. Na fila de julgamento, para conclusão até o final do governo Lula, ainda se encontram outros 22 mil processos. A auditoria do TCU nos processos que passaram pela Comissão de Anistia começou no ano passado e já resultaram na abertura de quatro processos para corrigir irregularidades. O primeiro deles, já acatado e modificado pelo Ministério da Justiça envolve a ex-ativista Maria Augusta Carneiro Ribeiro. Ouvidora da Petrobrás, no Rio, Guta reivindicava um pagamento retroativo de R$ 1,5 milhão e mensalidade de R$ 8.200,00. A Comissão de Anistia concordou com o questionamento do TCU e reduziu os valores para R$ 600 mil e mensalidade de R$ 3.500,00. O caso é emblemático e ilustra, segundo o ministro do TCU, Augusto Sherman Cavalcanti, "as bases frágeis" usadas pelo Ministério da Justiça para conceder indenizações que ainda passarão pela análise do órgão.
No acórdão sobre o caso, o ministro Sherman aponta uma série de inconsistências: o valor foi arbitrado com base numa declaração genérica, não houve confronto entre os períodos da perseguição e o atual para se chegar às perdas econômicas sofridas.
Outro caso polêmico, ainda pendente, envolve os ex-cabos da Aeronáutica, cujas carreiras foram encerradas em 1964 pela proximidade da categoria com o governo ex-presidente João Goulart. São 3.700 processos, sobre os quais a Comissão de Anistia considerou a tese de perseguição política contestada pelo Ministério da Defesa. O ministro do TCU questionou o entendimento de que a portaria de afastamento foi um ato de exceção e irritou o Ministério da Justiça.
– O TCU pode questionar os cálculos, mas não cabe a ele definir o que é ou não ato de exceção. Essa função é da Comissão da Anistia. O ministro extrapolou da sua competência – diz o presidente da comissão, Paulo Abrão. Ele admite, no entanto, que a lei é ruim por não prever o abatimento de outros ganhos obtidos pelo anistiado e diz que a comissão não tem meios para estimar as perdas do anistiado. Responsável pela mudança de critérios provocaram uma forte redução no valor das indenizações, Abrão diz que só reformará casos anteriores à sua gestão se houver decisão judicial.
Exageros
Ex-militante do movimento estudantil e membro do antigo PCBR, preso por nove meses em Recife em 1970, o deputado Pedro Eugênio (PT-PE), presidente da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, é um dos raros ativistas que, por opção, não pediram a anistia. Ele acha que "há exageros" na concessão de indenizações milionárias e afirma que a busca pecuniária reflete na demora em se esclarecer pendências dos anos de chumbo.
– Acho que tira o foco do que ficou pendente para se concentrar nas indenizações – diz o deputado.
Pedro Eugênio critica o modelo de cálculo que, segundo ele, criou duas classes de perseguidos.
– Quem era operário foi julgado com uma perspectiva de perda menor do que a de um advogado. Esse critério criou uma diferença social – acrescentou.
Preso e torturado, Pedro Eugênio tem uma explicação simples por não ter pedido a reparação:
– Quando entrei no processo de luta contra a ditadura estava consciente do que poderia acontecer. Sabia dos riscos – diz.
Jornal do Brasil
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